Conhecimento (p. 4)

Interesse:

Quando você era criança, ganhou de seu pai um bombom delicioso, um bombom de uma marca famosa de chocolates. Você quis mais e tanto insistiu que ganhou outro. Delicioso. Quantos fossem comprados, tantos seriam devorados. Por isso, seu pai percebeu que você seria capaz de levá-lo à falência e decidiu mudar a estratégia, indo até um supermercado no atacado e comprando um pacotão de bombons baratos, evitando, assim, a bancarrota.

Os novos bombons, no entanto, eram horríveis. E desde aquele dia você nunca mais se esqueceu da diferença entre quantidade e qualidade.

Obs.: O Amplitudo, preocupado que é com a sua saúde, acredita que o nível ideal de consumo de açúcar refinado pelo ser humano é zero. O exemplo acima foi apenas um recurso didático e não deve ser tomado como recomendação alimentar.

O mesmo se dá aqui, com o conhecimento. Não adianta preocupar-se exclusivamente com a quantidade (retenção e velocidade) e se esquecer da qualidade.

Não precisa ir longe. Bem, dependendo da sua idade, precisa ir um pouco, pois voltaremos aos tempos da escola. Lembre-se das matérias de que gostava e das que não gostava. Você aprendia mais aquelas de que gostava, certo? Pois aí está a chave: o interesse.

Você sempre demonstrará um desempenho elevado se o conhecimento a ser obtido estiver dentro da sua área de interesse. Lembre-se de que desempenho incomparável é a alma da Única Condição.

Sim, eu sei que nem sempre podemos escolher o que precisaremos aprender. Mas quase sempre podemos escolher com o que vamos trabalhar. Você é capaz de encontrar pessoas felizes e realizadas – para não dizer muito ricas – em qualquer profissão. Ou seja, é realmente possível trabalhar em algo muito prazeroso.

O interesse aumenta incrivelmente as chances de o conhecimento ser fixado. Por isso, trabalhar em algo de que não se gosta é uma escolha terrível, pois grande parte do tempo você passa se forçando a aprender coisas que, talvez, seriam naturalmente rejeitadas pela sua mente (enquanto sobre o seu hobby, por exemplo, você sabe tudo). E o resultado é um aproveitamento deplorável da sua capacidade de aprender.

Encontramos eco para esta recomendação em alguns autores como David Wood em Get Paid for Who You Are e Joel Comm em Cash. Eles recomendam fortemente que, ao desejar iniciar um website falando sobre um determinado tema (como o Amplitudo, por exemplo), você o faça em relação a um assunto pelo qual seja apaixonado. Todo o resto – inclusive saber fazer websites – é muito menos importante que isso.

Obs.: Esta foi a principal razão por eu ter escolhido elaborar o Amplitudo dentro de um assunto que considero interessantíssimo: liberdade no trabalho.

Autoconhecimento:

Nosso já conhecido amigo Baltasar Gracián nos diz: “Ninguém consegue dominar-se se não compreende a si próprio. Existem espelhos para o rosto, mas não para o espírito; tome lugar do espelho a ponderada autorreflexão.”

É bom assim, não é? Quando o diagnóstico do problema (falta de autoconhecimento) já vem acompanhado da solução (autorreflexão).

Penso que, se o conhecimento, como um todo, é muito importante, talvez o autoconhecimento seja mais importante ainda. Sim, porque, ainda que você tenha pouca ciência acerca dos fatos do mundo, se tiver bom conhecimento sobre si próprio, certamente evitará uma infinidade de escolhas erradas que, de alguma forma, o prejudicarão – e, com toda certeza, o afastarão de uma vida de liberdade.

Se você sabe, por exemplo, que não gosta de acordar cedo, não vai se juntar a uma equipe de aventura que sempre combina de sair às 5h da manhã. Você vai estar constantemente em conflito com eles – de fato, consigo próprio – se fingir que aquela situação não o está incomodando.

Se você sabe que não gosta de música clássica, não se submeterá a uma assinatura de concertos apenas para partilhar da convivência de distintos membros da sociedade. Você vai estar constantemente em conflito com eles – de fato, consigo próprio – se fingir que aquela situação não o está incomodando.

Por aí a coisa vai. O resumo é o seguinte: a falta de autoconhecimento gera conflito. E esta é a semente de um dos mais importantes assuntos sobre os quais poderemos um dia falar no Amplitudo. Mas, por hora, manterei o suspense.

Idioma:

Se estamos falando de conhecimento, temos que imaginar que ele pode se apresentar das mais diversas formas. Mesmo um passeio no zoológico pode acrescentar à sua vida certo conhecimento sobre a natureza e, com as analogias adquiridas, você pode ir muito além.

Não podemos nos esquecer, no entanto, de que quando o conhecimento é adquirido através da leitura, uma das diversas formas sob as quais ele pode se apresentar é ser oferecido em outro idioma.

– Sim, Álvaro, e para isso existem as traduções.

Temo ter que discordar de você.

As traduções, é claro, facilitam imensamente a vida. Dos livros que leio, mais de 90% deles não foram escritos originalmente em português, porém foram lidos nesse idioma. Certamente, minha vida seria muito mais triste não fossem os tradutores. Mas há, aí, algumas questões a frisar.

Primeiramente, há as falhas de tradução. Já vi pessoas com grande cultura tirarem conclusões absolutamente erradas a respeito de um trecho de um livro onde havia um erro de tradução que distorcia, quando não invertia, o sentido. Imagine o mal estar se essa pessoa utilizasse esse material em uma palestra para depois perceber, pelo ácido comentário de um dos ouvintes, que ela estava falando uma grande abobrinha.

Outra questão é o nível de imersão no conhecimento que está sendo buscado. Certa vez, ouvi uma pessoa dizer que queria ler os iluministas franceses em francês, para sentir melhor o que eles tinham a dizer. Esse sentir melhor se refere a uma característica das traduções, que é nem sempre possuir, no idioma-destino, palavras ou expressões correspondentes às do idioma-origem. Ou seja, em algum momento, alguma coisa se perde. Para aqueles que desejam o máximo possível, essa alguma coisa perdida pode representar muito.

Situação semelhante ocorreu quando outra pessoa mencionou que alguma eminência intelectual – que eu gostaria muito de saber que é, embora meu informante não mais se lembre, atualmente, de quem ele estava falando na época – declarou publicamente não conseguir sequer imaginar como alguém poderia filosofar em outro idioma que não o alemão.

Obs.: Provavelmente, a eminência sabia alemão. Já é uma pista…

A razão é quase a mesma acima apresentada para a questão do francês. Devido à precisão do idioma alemão – segundo a eminência – as questões complexas da filosofia eram melhor expostas e, portanto, melhor compreendidas – segundo a eminência – se elaboradas neste idioma.

Fale a verdade: uma frescura sem tamanho, não é?

Como eu disse, depende do quanto uma pessoa deseja o conhecimento, e do quão exato ela exige que ele o seja. Talvez para você ou para mim, essa exigência não seja tão grande.

Aliás, da minha parte, não sei francês e não sei alemão. Absolutamente nada. Sabendo que o tempo é limitado e que tenho diversos interesses prioritários ao aprendizado desses dois idiomas, opto por não estudá-los no momento. Sinceramente, não sofro com isso. Creio ser apenas o respeito ao meu autoconhecimento. Na verdade, penso assim: como a falta desse aprendizado não demonstra estar impondo restrições significativas à minha vida, se há outro assunto que me entusiasma mais, não o trocarei por um que me entusiasma menos.

Apenas uma ressalva deve ser feita em relação ao inglês, cujo estudo não considero uma opção.

Apesar de eu gostar bastante desse idioma – o que torna minha recomendação um pouco suspeita – acredito que você conseguirá enxergar nas minhas palavras uma praticidade amplitudiana que vai além de uma simples afinidade particular.

Devido a diversos fatores, especialmente os histórico-econômicos, o inglês se tornou uma língua amplamente falada em todo o mundo. E o mundo inteiro produz conhecimento. Como o conhecimento deseja (precisa) ser compartilhado, é natural que você atinja mais pessoas se falar na língua que mais pessoas conseguirão entender. Por isso, não importando onde o conhecimento é gerado no mundo, ele sempre busca ter uma versão em inglês, exatamente para poder ser absorvido por pessoas que têm dificuldade por compreender o húngaro, por exemplo, ou o russo – pessoas como esta que lhe fala.

Além disso, a conjuntura atual nos mostra uma força capitalista muito grande em alguns países de língua inglesa, especialmente os Estados Unidos e a Inglaterra. Tendo o hábito de investir em pesquisa, e tendo bastante dinheiro para fazê-lo, é natural que muito conhecimento desponte para o mundo originalmente nesse idioma. Conhecê-lo o permitirá, então, ter acesso ao conteúdo de forma ou mais rápida ou mais eficiente (por causa da não existência de desvios de tradução) ou ambos.

Pode ser ainda que, por um bom tempo, o conhecimento só esteja disponível neste idioma, pois, em geral, a necessidade crítica de tradução se dá das outras línguas para o inglês – por causa da abrangência mencionada – quando o contrário não tem a mesma força.

– Ah, mas a Alemanha também não investe em pesquisa? Ou o Japão…

Bem, se você vai querer ser chato a esse ponto está mesmo na hora de falarmos de matemática…

Matemática:

Aqui está algo muito interessante. Você se lembra de quando falamos de analogias, um pouco acima?

Pois bem. Para o estabelecimento de analogias o cérebro precisa ser capaz de realizar uma proeza chamada abstração. Sim, porque quando você usa um modelo (lembra do tijolo?) para explicar outra coisa, está transportando características de algo que existe – o modelo – para algo que não existe, ao menos daquela maneira – que é o que você está tentando explicar. Bem, se as condições do que você está tentando explicar não existem da maneira que você explica, o que você está dizendo não é necessariamente palpável, tangível, concreto. E se não é concreto, há de ser abstrato.

Quando eu era menor, sofria por não entender a razão do estudo de algumas áreas da matemática. A decomposição de polinômios de grau n, por exemplo, não me parecia servir a coisa alguma na minha vida. Você já deve ter se sentido da mesma forma.

Obs.: Até hoje ainda não encontrei utilidade direta para polinômios complexos, mas finja que eu não disse isso, para não depreciar meu ponto de vista…

Um dia, porém, veio a luz. A questão não era exatamente saber polinômios, ou geometria analítica, ou o que fosse. Grande parte daquilo, na verdade, eram tão somente exercícios para a cabeça. Lidar com polinômios e com suas simplificações era lidar com coisas tão irreais que a mente era forçada a trabalhar em um nível diferente, um nível que a realidade das coisas do dia a dia não lhe impõe. E, com isso, a mente se desenvolvia – como em um condicionamento físico, onde o objetivo é, definitivamente, a melhora da saúde e/ou da aparência de forma generalizada, e não a dor dos exercícios.

Esse treino de abstração, de fazer força para pensar sobre o que não pode ser visto, tocado etc., torna mais fácil adquirir determinados tipos de conhecimento que, por sua vez, o capacitam para novos desafios intelectuais, posicionando-o à frente de muitas outras pessoas e tornando seu desempenho cada vez mais inigualável.

Quem consegue pensar matematicamente não tem dificuldade para lidar com tijolos como histórico, modelo, cenário, lógica e consequência. E, se em terra de cego quem tem um olho é rei, em terra de pessoas que mal sabem se expressar sobre coisas concretas – o nosso mercado de trabalho – ter capacidade de desenvolver raciocínios mais elaborados e abstratos é possuir uma habilidade preciosíssima.

Mas, se você é daquelas pessoas que realmente não gostam da questão e leu esse tópico franzindo as sobrancelhas nos mais diferentes ângulos, pense apenas no que vou dizer agora.

Existem algumas coisas bem simples na matemática que doem menos que polinômios e que farão a maior diferença na sua vida, especialmente no seu emprego. Uma delas é o cálculo de porcentagens. Acompanhe cautelosamente a história a seguir.

Em A Única Condição, mencionei ter estado à frente de uma agência de viagens. Entre outras grandes experiências que tive, uma delas foi notar a frequência com a qual eu era questionado pelos agentes a respeito do correto cálculo das comissões das passagens aéreas.

Esse setor era muito complexo, porque a empresa de onde comprávamos as passagens nos comissionava nem sempre sobre o total, mas sobre o total com alguma dedução. Assim, se nossa comissão era simplesmente de 6%, a conta seria fácil: seis por cento do total. Mas se, em uma negociação favorável, nos fossem concedidos mais 3%, esse adicional já não era calculado sobre o total, mas sobre o total descontado de nossa comissão regular. Ou seja, os outros 3% incidiam sobre apenas 94% do valor da passagem – o famoso “6 mais 3 sobre 94”.

É lógico que os 6% mais os 3%, nesse caso, não resultariam em 9%, o que facilitaria muito a conta. Como os 3% incidem sobre 94%, isso equivalia a 2,82% do total e que, por sua vez, somados aos 6% da comissão original, resultavam em precisos 8,82% do valor da passagem.

Sabe onde estava o enrosco? Nesses 2,82%. Como as pessoas não sabiam expressar porcentagens em números decimais (dez por cento é 0,1; meio por cento é 0,005…) não era um caminho suave para alguns fazer a conta de 3% sobre 94%, o que facilmente podia se obter multiplicando 0,03 por 0,94.

Amantes que eram do tijolo atalho sem a percepção das vantagens do tijolo esforço, as pessoas queriam sempre utilizar o botão de porcentagem da calculadora. Só que, em uma operação de cálculos em série, sempre tinham que ficar fazendo a conta toda desde o início quando erravam um dígito perto do fim do processo. Se, no entanto, fossem capazes de estruturar a equação com números decimais, poderiam calcular diversos níveis de comissão sobre comissão sem se perder.

Situações semelhantes são facilmente encontradas nas esquinas da vida, e algumas com consequências diretas sobre o seu dinheiro. Levou bastante tempo, por exemplo, para uma pessoa de meu relacionamento perceber a existência de juros compostos em um empréstimo, vivendo na ilusão de que 2% ao mês resultariam em 24% ao ano. Se ela tivesse observado que, na equação financeira do cálculo de juros o número de parcelas é colocado no expoente, e não em uma relação de multiplicação simples, poderia ter desconfiado que aquela coisa toda cresceria de forma não linear, mas progressivamente. Para usar o termo exato, subiria exponencialmente. Sim, subiria exponencialmente porque o número de parcelas está no expoente.

Faz sentido, não?

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