Conhecimento (p. 2)

Se, após o aperfeiçoamento, você há de ter melhor remuneração, não é difícil concluir que conseguirá, com a diferença salarial, retornar o investimento realizado. Quando isso ocorrer, você estará na mesma situação financeira anterior do ponto de vista estático (a reserva de trinta mil), mas em situação financeira muito melhor do ponto de vista dinâmico (seu salário maior).

A paciência cultivada nesse processo certamente lhe terá fornecido após algum tempo – digamos, dois ou três anos – condições de alcançar seu objetivo de forma mais inteligente. Ah, também lhe deu tempo para pensar. Talvez você nem queira mais tanto assim o carro lindão de cem mil. Talvez um de sessenta baste e, com os quarenta restantes… Puxa vida, com quarenta mil dá para fazer muita coisa, não é?

A paciência é, realmente, formidável. Ela lhe dá forças, por exemplo, para estudar até mesmo sem ter muita ideia de como o conteúdo assimilado poderá lhe ser útil. E estamos de volta ao tema…

Assim como ocorre nos jogos de estratégia medieval, conforme você adquire mais conhecimento através de pesquisas e desenvolvimentos (no ambiente do jogo), você é capaz de obter melhores recursos e armas, mais capacidade de construção, melhores colheitas e habilidades etc. Só que essas pesquisas levam tempo. Pior: quanto maior for o objetivo que você pretende alcançar, mais tempo leva a pesquisa que o conduzirá até lá.

E alguns pais se preocupam que seus filhos joguem esses jogos. Não precisariam se preocupar tanto se analisassem e exercitassem com eles as analogias contidas nos jogos. Vejamos até onde este exemplo vai nos levar.

Se você precisa de um carro para se locomover, basta comprá-lo. Você faz o mesmo se precisar de roupas novas. Não ter qualquer uma dessas coisas não é impedimento, por exemplo, para conseguir um emprego. Aliás, já presenciei o caso de uma pessoa que, para conseguir um emprego como representante comercial, precisava possuir veículo próprio. Ao ser questionada se o possuía, respondeu, em um súbito acesso de genialidade, que sim.

Mas ela não possuía o carro.

Conseguindo o emprego, ela saiu correndo para comprar o carro, o que foi feito em uma semana. Como? Parcelado, é claro, uma vez que não havia reserva disponível. E eu, que sou bastante contra os parcelamentos que a sociedade comercial nos oferece, demonstrei total apoio ao caso, pois não se tratava de uma vontade, mas de uma real necessidade – e parcelas servem exatamente para o caso de uma real necessidade. Consolo ainda maior é pensar em quem pagaria as parcelas.

– E quem pagaria as parcelas, Álvaro?

Ora, o emprego recém-conquistado.

– A pessoa conseguiu um emprego que pagava as prestações do carro dela?!

Hum… não é bem assim. O seu pensamento está sendo muito direto, enquanto o meu é um pouco lateral. Indiretamente, o emprego recém conquistado pagaria as prestações do carro dela através de uma coisa chamada salário – que não existiria se não houvesse o carro.

– E você jura que ainda estamos falando do jogo de estratégia medieval?

Pois observe enquanto me responde a seguinte pergunta: se o emprego demandasse “mestrado na habilidade X” e a pessoa não o possuísse, como a situação seria resolvida em uma semana?

Perceba que, por mais dinheiro que se tenha, nenhuma instituição séria ofereceria uma certificação de mestrado a uma pessoa com apenas uma semana de curso.

Quando você pensa em conhecimento, portanto, a antecipação (discutida no tijolo cenário) é vital. Do contrário, seria como se, para conseguir o emprego do caso anterior, você precisasse minerar o ferro para construir o carro. Ou seja, inviável.

Dá para resumir, então, em uma só frase: o conhecimento precisa ser adquirido antes da necessidade de usá-lo.

E, se quanto maior o benefício pretendido maior deve ser o tempo dedicado aos estudos, não fica difícil aceitar o inverso: quanto maior o tempo dedicado aos estudos, maiores tendem a ser os benefícios conquistados.

Vale para o joguinho de estratégia. Vale para a vida real.

Por isso, acumular certa dose de conhecimento de forma generalizada é bom, pois você nunca sabe em que área aparecerá a demanda por conhecimento. E como sei que você bem gosta de um dinheirinho – quem não gosta? – mencionarei mais um caso real, caso este que tem impactos financeiros no fim da história. Impactos ruins, mas edificantes.

Certa vez, convidei um amigo de infância para uma palestra sobre investimentos financeiros. A recusa do convite foi fundamentada na então ausência de recursos financeiros para investir.

A resposta parece bastante lógica, não parece? Se não há recursos para investir, por que conhecer investimentos? Seria como você conhecer técnicas de respiração de emergência na atmosfera de Júpiter se nem sequer passa pela sua cabeça fazer uma viagem interplanetária.

Pois é, mas não é bem assim. Precisamos lembrar que investimentos podem ser feitos com quaisquer quantias e o que se aprende para um montão, vale também para um pouquinho. Meu colega não era um mendigo, pois recebia um salário mensal. Isso significava que ele possuía um fluxo constante de entrada de recursos. Bem, se não dispunha de reserva para investir, é porque seu fluxo de saída consumia tudo o que entrava.

Obs.: Essa, sozinha, já seria razão suficiente para ir urgentemente a uma palestra sobre finanças… Será que, ao prestar atenção no que as pessoas ricas têm a dizer a respeito de investimento, meu amigo não poderia ter tido alguma ideia de como melhorar suas finanças?

Estou certo que sim, pois isso acontece com todo mundo que se expõe a esse tipo de conhecimento. Conseguir efetivamente adotar uma nova e saudável postura é outra coisa, pois demanda disciplina, mas ideias para serem colocadas em prática certamente surgiriam aos montes.

E tem mais. Já analisamos que o conhecimento leva tempo para ser adquirido. Quando o meu amigo acreditar que possui dinheiro suficiente para investir e, então, começar a sua instrução financeira, passará um bom tempo investindo incorretamente (entende-se: perdendo dinheiro) até que consiga “acertar a mão”.

Faz sentido se antecipar nesse caso, não faz? Mais do que pensar em respirar na atmosfera de outro planeta…

Agora o que dói de verdade: a palestra, em si, era de graça. A pessoa não foi porque não quis. E, durante algum tempo – sei porque acompanhei o caso – continuou tomando decisões financeiras equivocadas.

Vamos, agora, através de uma historieta singela, ilustrar uma belíssima característica do conhecimento: a sua indestrutibilidade.

Lembra que falamos sobre garantias, e que a única garantia é ser útil, não lembra? Ressaltemos que o que nos capacita a ser úteis é o conhecimento. Pois bem, segura essa ideia um pouco. E vamos à historieta:

Ia subindo uma rua um rapaz quando viu, descendo a mesma rua, um amigo seu com um queijo nas mãos (provavelmente, essa história possa ter ocorrido em Minas Gerais).

Ao se encontrarem, o dono do queijo fraternalmente ofereceu dividir a iguaria com o seu amigo. Ao se despedirem, cada um foi embora com metade de um queijo.

Em outra rua, outros dois amigos se encontraram. Um deles comentou que tinha uma ideia e que gostaria de dividir essa ideia com o outro. Compartilhada a ideia, cada um foi embora com uma ideia inteira.

Essa história é linda, não é?

E essa condição de indestrutibilidade do conhecimento é a chave pela qual ele se torna a garantia da garantia: o conhecimento amplia a sua garantia porque ninguém consegue subtraí-lo de você.

E há benefícios adicionais.

Em seu livro – já citado aqui – Get Paid For Who You Are, David Wood diz: “o conhecimento é uma grande chave para a autoconfiança”. Nem ele nem eu queremos que você tome um chá de frases de efeito, mas não dá para negar que sentir-se confiante é melhor que o contrário. E se o conhecimento ajuda na aquisição da confiança – o que se nota nos palestrantes experientes – fica registrada mais essa para a nossa coleção de razões em defesa do conhecimento: a segurança proporcionada.

Falando em experiência – e também porque ela está assinalada como definição de conhecimento no dicionário – é interessante fazermos uma distinção que, possivelmente, será bem aceita por você.

Algumas definições do dicionário são oferecidas por extensão. Isso significa que o que está sendo colocado como definição mantém com a palavra definida mais uma relação de causa ou de consequência do que de igualdade.

Acontece isso nesse caso. A experiência, intuitivamente, está mais ligada à prática, à “mão na massa”, aos anos de dedicação a uma atividade, enquanto que o conhecimento está mais relacionado à teoria, ao estudo, à preparação, à sala de aula etc. A prova que essa diferença existe está nas vagas de emprego que solicitam “experiência”. Elas não solicitam “conhecimento” e, com isso, estão sendo bem claras: querem uma pessoa que já tenha trabalhado naquela função anteriormente. Só ter estudado, nesse caso, não é suficiente.

Podemos ver mais um exemplo dessa diferença no meio acadêmico. Existem algumas pessoas – uma eu conheci bem de perto – que, por gostarem muito de estudar, mantiveram-se em sala de aula pelo tempo que lhes foi possível (faculdade, pós, mestrado, doutorado etc.). É incrível pensar na quantidade de conhecimento que essas pessoas adquirem quando fazem esta opção.

Mas, apesar de tanto conhecimento, essas pessoas não estão adquirindo experiência. Não estão, por exemplo, vendo a realidade do mercado de trabalho e as dificuldades enfrentadas no dia a dia. Essa ausência de conhecimento prático é algo limitante – e limitante não é uma palavra que o Amplitudo aprecie muito, pois que conflita com aquela outra, a liberdade, pela qual somos apaixonados.

Uma destas limitações é a colocação desse profissional no mercado de trabalho. Sua vivência neste ambiente é tão pouca – quando não nula – que não sobram muitas opções para esse profissional a não ser dar aulas, muitas vezes na própria instituição em que ele se formou e na qual permaneceu durante tanto tempo.

É claro que eu não vejo nada contra dar aulas, pelo contrário. Poucos são os ambientes mais energizantes que uma sala de aula de uma faculdade. A grande questão é: será que o profissional pós-doutorado em determinada área deseja dar aula?

Veja que uma coisa é dar aula pelo fato de ser apaixonado por esta atividade e, por isso, ser muito feliz. Total opção. A outra coisa é dar aula por não conseguir fazer mais nada e ser infeliz. Total falta de opção.

Coroando a diferença entre os conceitos experiência e conhecimento e reforçando, mais uma vez, a importância deste último, citemos esse belo trecho de Mais Tempo Mais Dinheiro: “A experiência lhe será presenteada pela vida […]. No entanto, o conhecimento melhora a sua capacidade de reflexão e aumenta a sua perspicácia.”

Pode parecer hipocrisia da minha parte pedir permissão para uma digressão, já tendo feito isso tantas vezes sem aviso, mas é que, agora, deu vontade. Talvez eu esteja ficando mais velho e mais responsável…

Certa vez estive em um evento público. Dezenas e dezenas de pessoas. Não há necessidade de detalhar características, exceto por esta: tínhamos que ficar aguardando por um longo tempo todos juntos em um grande salão, e cada um era chamado em seu devido momento.

Enquanto eu aguardava, percebi que, assim como eu, algumas pessoas utilizavam aquele tempo de espera para qualquer coisa útil. Não havendo muito mais o que pudesse ser feito (não dava para jogar basquete, por exemplo), essas pessoas estavam todas a ler, cada qual uma leitura de sua preferência.

Só que essas pessoas não ultrapassavam 10% do total do salão. Posso afirmar com segurança, pois eu as contei (havia tempo, não havia?).

Como eram muitas pessoas – algo como duzentas – se você somar o tempo de espera de todos perceberá que houve muito, muito, muito tempo de espera. Se quiser realmente ser chato como eu e calcular, estamos falando de mais ou menos 180 pessoas (200 – 10%) esperando um tempo médio de 2 horas sem fazer absolutamente nada.

Isso dá um total de 360 horas desperdiçadas por essa legião de representantes da humanidade. Questiono-me: quanto conhecimento não poderia ter sido adquirido nesse tempo deliberadamente não aproveitado? Estamos falando de 360 horas. É praticamente um mestrado que se perdeu naquele dia.

Digressão-desabafo finalizada, podemos voltar ao desenvolvimento do nosso tema propondo algumas últimas reflexões.

Comecemos por traçar um paralelo entre as áreas tradicionais do conhecimento sabidas por qualquer aluno vestibulando (exatas, humanas, biológicas) e as pontas da sua Estrela – agora que você já as conhece inteiramente.

Obs.: Não custa lembrar, a essa altura do campeonato, que sua Estrela deseja se expandir com equilíbrio. Uma carência muito grande de uma das pontas em favorecimento de outra poderá prejudicar sua qualidade de vida e, em última instância, sua liberdade. Não se esqueça daquelas repetições no começo dos textos: cada uma das pontas da sua Estrela, se usadas de forma deficiente, podem restringir sua liberdade. Você pareceu concordar com isso lá atrás. Não vá arranjar encrenca agora.

Quando um aluno precisa escolher uma entre as três diferentes áreas do “conhecimento vestibulando”, ele não é avisado, em momento algum, que deveria, para o seu próprio bem, desenvolver todas elas ao longo da vida, não só porque alguém inventou que existe uma tal de Estrela em um tal de Amplitudo, mas porque, se estas áreas não forem desenvolvida de forma equilibrada, poderão restringir a liberdade do vestibulando no futuro.

Não, ninguém diz isso a ele.

E porque ninguém diz isso a ele, ao escolher uma área ele, inconscientemente, escolhe ignorar as demais. Se o aluno escolhe jornalismo (humanas), passa a ignorar qualquer coisa referente à biologia. Se o aluno opta por engenharia (exatas), passa a desprezar o importante conteúdo que o estudo da Comunicação pode lhe fornecer.

Isso traz consequências. O jornalista, nas suas decisões alimentares diárias, cometerá um erro após o outro e prejudicará sua saúde. Ele não precisa conhecer cada uma das 4.874.973 etapas do maldito ciclo de Krebs (desculpe, trauma do ensino médio), mas um pouquinho de conhecimento poderia tirá-lo de enrascadas futuras como obesidade, infarto, diabetes…

O engenheiro, por exemplo, embora exímio projetista, não conseguirá perceber os efeitos de sua conduta ou de seu discurso, cujo conteúdo talvez enfoque somente o próprio trabalho em detrimento dos interesses de seu cliente. Um pouco de negociação e um pouco mais de estudo do próprio idioma certamente teriam auxiliado.

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